terça-feira, outubro 03, 2006

:: Eu e minha ilha


Eu sou Sandra Maria, casada há 34 anos , mãe de um belo rapaz de 32 anos e duas princesas com 31 e 19 anos. Sou professora há quase 20 anos (engravidei da minha nenê durante o estágio), me formei em agosto de 1986 e em março de 1987 prestei concurso na Prefeitura de Gravataí e me classifiquei em 25º lugar, começando a trabalhar ainda neste mês. Moro há 26 anos aqui em Gravataí, mais precisamente na Morada do Vale I.
Vir morar nesta cidade foi para mim passar pela porta das decisões. Nascida em Porto Alegre, jamais pensei em sair de lá e ao passar por aqui a caminho da praia achava o lugar muito sem graça e até antipático, comentando com meus pais e amigos que jamais moraria aqui, Só que , como diz o ditado popular, "nunca se deve dizer que desta água não beberei", meus pais, que moravam em apartamento, compraram uma casa neste novo loteamento e eu, que sempre os seguia pois meu marido viajava muito, para ficar perto deles e por morar de aluguel,acabei por, muito a contragosto,comprar também uma casa há uma quadra de distância da deles. Sem saber, estava eu partindo para minha ilha desconhecida.
Nunca pensei em me tornar professora, só que, como o homem do barco, o destino já estava mesmo atrás de mim, já havia estendido a mão para tocar-me o ombro.
Sempre quis trabalhar fora, ter uma atividade que me realizasse mas, sem experiência, sem qualificação nenhuma, me deixava ficar meio acomodada aos afazeres domésticos e maternais .
Ao vir para esta cidade, fiz amizade com as vizinhas, as quais me convidaram para fazer parte de um grupo que queria erguer uma igreja pois as missas eram rezadas na sala de aula de uma escola e precisávamos levantar fundos para comprar o terreno e o material de construção. Nos engajamos de corpo e alma neste projeto e aí está a Igreja Santa Rita de Cássia (acho que esta Santinha tem simpatia por mim). Este convívio, e todas as dificuldades enfrentadas, estreitaram nossos laços de amizade e, uma delas, pedagoga assumiu a direção de uma nova escola do bairro (atual CIEP) e precisava de voluntárias para ajudar na inscrição dos alunos novos e pequenos serviços burocráticos. Ela, sabendo da minha disponibilidade, convidou-me para ajudá-la, e eu aceitei. Fiquei tão maravilhada com o ambiente escolar, com as novidades, as novas amizades e, perfeccionista que sou,fazia tudo que me pediam com todo o cuidado, com muita alegria e boa vontade. Estas pessoas começaram então a me incentivar a voltar a estudar:
- Tu levas jeito, porque não fazes o magistério, passa tão rápido, quando te deres conta já estarás lecionando, trabalhando aqui com a gente.
Neste interim, fui tentar novamente fazer a inscrição dos meus filhos no Dom Feliciano (eles estudavam no Gensa). Meu marido foi junto, e ao chegar na escola ficamos sabendo que era diretora a Irmã Otília, muito conheçida da família do meu marido por ter sido professora da minha cunhada no Colégio Glória. Enquanto era feita a inscrição perguntei, sem maiores intenções, se havia vaga no curso de Magistério, comentei que tinha interesse de voltar a estudar e que estava pensando neste curso. Ela respondeu que o curso já estava com as vagas preenchidas mas que eu poderia cursar primeiro ano do curso de Análises e no ano seguinte, após realizar uma prova poderia passar para o Magistério, comentou ainda que seria interessante eu e meus filhos estarmos juntos toda manhã.
Fiquei entusiasmada e meu marido sugeriu que fizéssemos a minha matrícula naquela hora mesmo - olha o exato momento em que o destino estava com a mão sobre o meu ombro - saí de casa pensando somente em fazer a matrícula dos meus filhos e voltei para casa matriculada no curso de professora.
Foram três anos e meio que passaram voando. Quando dei por mim já estava em sala de aula, e foi ai que descobri a minha vocação. Com uma turminha de 2ª série, aqueles toquinhos com os olhinhos fixos em mim, senti como se cada um deles fosse um de meus filhos, e foi assim que agi, como mãe que ama, que educa para a vida, que transmite conhecimento, que quer vê-los aprender sem medo, orientando, induzindo a conhecer.
A cada turma que recebo no primeiro dia de aula, tenho por conduta receber cada aluno como uma página em branco, sem preconceitos, sem rótulos,valorizando sempre o percurso que teremos( rumo à ilha desconhecida) onde todos aprenderemos, eu com eles e eles comigo. Tenho a ousadia de apostar (e sempre me dei bem) na afetividade, na valorização das qualidades de cada um, na amizade e carinho. Não tenho medos pois todas as minhas atitudes são orientadas pelo respeito aos meus alunos, pelo coração e pela fé.


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